Transcrição do Texto: Bases Epistemológicas da Psicanálise

Quais eram os pensamentos filosóficos e psicológicos que permearam a emergência desta corrente, assim como apresentar os principais pontos da obra de Freud. Deste modo, considerar as decorrências de um momento histórico, a emergência de uma revolução, o advento de uma ciência ou um ideal, com o fito de apresentar uma análise histórico-epistemológica, discutindo fundamentos e apresentando possíveis vias de interpretação da questão em evidência
É necessário que haja uma contextualização dos acontecimentos
Ou seja, quando contextualizamos devemos abordar historicamente a época em que o assunto em discussão se deu, tomando desta forma desde a localização geográfica e temporal dos fatos
O presente texto apresenta a situação histórico-político-econômico-social e filosófica da Europa do final do século XIX, a fim de fundamentar histórica e epistemologicamente os principais pontos teóricos da Psicanálise freudiana, os quais são expostos em seguida.

O grande período que antecede o século XIX foi marcado por importantíssimas modificações na constituição social e política mundial

A passagem da Renascença:

1º Marcando o início da Idade Moderna e o fim do longo período que foi a Idade Média;
2º O desenvolvimento deste novo período:
3º Culminando com o Iluminismo no século XVII;

As Reformas Religiosas - O desenvolvimento da consciência individual e coletiva:

Levando às lutas e enfrentamentos como a Revolução Francesa;
A Revolução Industrial;
Esta última de caráter fundamentalmente econômico.
Alguns produtos destes grandes movimentos sociais ocorridos na Europa:
a necessidade da reestruturação e delimitação do poder;

A proposição de novos modos de conhecimento - 1º O científico; 2º O tecnológico.

Como conseqüência da Revolução Industrial ainda temos, em última análise, a Revolução Francesa, que se caracteriza por uma sistematização política das novas relações econômicas estabelecidas, abrindo espaço para o desenvolvimento das ciências humanas, até mesmo da Psicanálise, que é nosso objeto de estudo.
Ainda um importante determinante para os acontecimentos e decisões posteriores. Um dos fatos que fazem parte deste século é o surgimento da Psicanálise: em Freiberg, na antiga Checoslováquia, atualmente Pribor, em 6 de maio de 1856, nascia o homem que quarenta anos depois daria o impulso inicial a um sistema de pensamento chamado Psicanálise. Entretanto, a teoria nasceu em Viena, local onde a família de Sigmund Freud (1856-1939) estabelecera residência a partir de 1860 e em que o próprio autor permaneceu por quase oitenta anos.

O século XIX foi um período marcado por diversas batalhas e lutas na Europa:
1º - Lutas entre regiões de domínios diferentes
2º - Enfrentamentos de classes lutando pelo poder
3º - O proletariado mostra sua força de coesão e sua consciência.
As cidades sofriam com o crescimento demográfico:

1º - O êxodo rural crescera muito em virtude das fracas colheitas e infrutíferas tentativas de trabalho no campo;
2º - O desemprego também era crescente, pela escassez de mercados e excesso de produção.
Em decorrência disto, temos a produção de conhecimento enveredando-se por dois caminhos distintos mas paralelos:

A produção do conhecimento em si(como desenvolvimento das ciências em geral);
a) - As ciências naturais;
b) - A Física;
c) - A Biologia;
d) - A Química;
e) - E o desenvolvimento do conhecimento
(como especialização e formação profissional) - Cerca de 20 anos após o início do processo de industrialização alemão, a filosofia romântica e idealista é abandonada, dando lugar aos conhecimentos desenvolvidos no campo das ciências naturais, como a fisiologia, que mantinha estreita relação com o estudo da física.


Sigmund Freud, um homem que causaria reações adversas ao criar a Psicanálise, encontrando muitas dificuldades para que sua teoria fosse reconhecida no meio científico vienense. A ênfase dada pela Psicanálise ao papel da sexualidade a Psicanálise trabalhava com conceitos e hipóteses, como o inconsciente, Freud propunha o homem como um ser em conflito entre forças antagônicas (as pulsões e a cultura repressora) e atribuía grande importância aos acontecimentos da infância e sua presença no mundo mental adulto, características que o aproximavam do movimento romântico e o afastavam das ciências naturais.
Inicialmente Freud estudava o cérebro de indivíduos com patologias psiquiátricas após sua morte, na tentativa de vincular a observação clínica com lesões orgânicas. Formou-se em 1881 e começou a prática em neurologia clínica. Neste período, associa-se a Josef Breuer. Discutem juntos casos de pacientes de Breuer, como a hidrófoba Anna O. sendo personagem fundamental para a constituição da Psicanálise. Anna O. tinha sintomas de histeria: paralisia, ausência de memória, náuseas, distúrbios de fala e visão. Breuer tratava-a pela hipnose, através da qual lembrava-se das experiências vivenciadas que a impediam de beber água. Breuer conseguiu curá-la com este método, por redução ou eliminação de sintomas. Durante um tempo Freud adotou o método hipnótico para tratar seus pacientes; no entanto, percebeu que nem todos podiam ser hipnotizados e que, além disso, em muitos casos os sintomas reapareciam. Usava a associação livre de idéias (catarse)que traziam à tona conteúdos inconscientes, causadores de distúrbios.
Conheceu Jean Martin Charcot (Paris, 1895). Pela observação do tratamento oferecido por Charcot a seus pacientes histéricos, Freud hipotetizou a base sexual dos distúrbios. Acreditava que os fatores sexuais eram os verdadeiros causadores das neuroses. Freud empregou um método de interpretação dos sonhos, a partir do qual realizou também sua auto-análise. Neste momento, escreve A interpretação dos sonhos (1900), obra em que desenvolve com consistência a idéia da capacidade de conteúdos inconscientes determinarem e modificarem ações e atitudes.

2. A Epistemologia:
A partir dos parâmetros sócio-histórico-político-culturais dos séculos XIX e XX, na Europa, é que surge a Psicanálise, não só como o resultado de uma evolução de conceitos e diretrizes filosóficas e científicas, mas principalmente como uma "ruptura" em relação ao conhecimento até então existente e predominante. Quando nos referimos a uma "ruptura" realizada pela Psicanálise em relação ao conhecimento predominante na época de seu surgimento, estamos nos referindo principalmente às relações entre o pensamento de Freud, o Positivismo e o próprio projeto de Psicologia, proposto por Wilhelm Wundt (1832-1920). Auguste Comte (1798-1857). Ele formula que o estado positivo é marcado pelo predomínio da observação em relação à imaginação e à argumentação, que ficam subordinadas àquela. A fim de apreender e explicar os fenômenos psicológicos, o espírito positivo deve buscar suas relações imutáveis, da mesma maneira que faz quando trata de fenômenos físicos, tal qual o movimento ou a massa (Comte, in Os Pensadores, 1988). O Positivismo reafirma as proposições kantianas quanto à causalidade das coisas, em oposição à concepção mecanicista aristotélica vigente por tanto tempo.
Assim, se existem na obra de Freud influências mecanicistas (tal como a formulação do Complexo de Édipo, a partir do qual toma a primeira infância como um conjunto de ocorrências que se repetem em todos os seres humanos desde o seu nascimento até aproximadamente os 5 ou 6 anos de idade), a influência do Positivismo é também uma marca em sua produção, de tal modo que encontramos uma analogia direta entre ciências positivas, como, por exemplo, a Física e a Química, e alguns pontos da Psicanálise. Tal influência caracteriza-se fundamentalmente pela constante tentativa de Freud equiparar o psiquismo a algo orgânico, a qual é em alguns momentos mais intensa, como no início de sua obra, e em outros menos.
Para Freud, sempre há uma causa para quaisquer eventos ocorridos na vida do ser humano, não pode haver eventos mentais sem uma causa que os determine e é em busca destas causas que Freud instaura o trabalho de análise: trata-se de decompor os elementos mínimos que motivaram a formação dos sintomas, a fim de encontrar a origem dos mesmos.
Retomando e explicitando um pouco melhor os caminhos tomados por Freud em seus estudos, teremos que num primeiro momento há o confronto do discurso do indivíduo analisado com os fatos por ele vividos. A conclusão a que Freud chega a partir desta observação é de que não há comprovações acerca de uma relação verídica entre o que é dito pelo paciente e aquilo que efetiva-mente ocorre. A partir daí, num segundo momento ele irá investigar a simbologia/significação que a pessoa atribuiu à experiência relatada. Freud passa então a analisar o discurso internamente nas suas várias manifestações.
É neste sentido que encontramos a "ruptura" da Psicanálise em relação aos modelos científicos vigentes.Cabe neste momento resgatar a relação das proposições de Franz Brentano (1838-1917) com o pensamento psicanalítico, aprimorando desta maneira as relações da obra freudiana com o Positivismo e introduzindo aquelas que dizem respeito ao projeto de Psicologia apresentado por Wundt.
Brentano apresenta um projeto de Psicologia empírica, enquanto Wundt fundamenta seu trabalho como uma ciência experimental.
o trabalho de Brentano não abandona por completo a experimentação, apenas não a enfatiza como primordial.
Brentano afirmou que a Psicologia poderia ser empírica, estudando a atividade mental, em vez do conteúdo mental; ou seja, ele não rejeita a experimentação, mas acredita que o objeto da Psicologia deveria ser o ato mental — ato mental de ver, por exemplo, em vez do conteúdo mental daquilo que é visto.

3. Um passeio pela teoria psicanalítica freudiana
Freud em sua prática psicanalítica tem como objeto de estudo o inconsciente humano(ao qual pretende atingir pela observação através do método de associações livres (o paciente fica deitado em um divã, durante a sessão terapêutica, e relata o mais fielmente possível tudo o que lhe ocorre à mente naquele momento, mesmo e sobretudo se tais ocorrências aparentemente forem desordenadas e desconexas). O inconsciente é observado por Freud não sob a forma direta, mas como instância real, investigado pelas suas manifestações_, modo que pode ser utilizado para a observação e o conhecimento da estrutura psíquica humana).
Freud parece seguir, de algum modo, muito mais o pensamento de Brentano do que seu próprio precursor, que foi Wundt, uma vez que baseia todo seu trabalho na observação, inclusive pela impossibilidade de realizar experimentos com o inconsciente.
Ainda quanto à relação da Psicanálise com a Psicologia proposta por Wundt, podemos afirmar que se Wundt propõe investigações a respeito da experiência imediata do sujeito, ou seja, a experiência tomada como acontecimento independente de quaisquer interpretações ou sensações, Freud se diferencia dele por seu objeto de estudo, considerando-o como a experiência vivida. Ocupa-se do que é vivido pelo sujeito, como é percebido, assimilado, processado, e quais são seus produtos, daí a formulação do inconsciente como objeto de estudo.
Wundt realiza estudos baseando-se na coexistência de causalidade física e causalidade psíquica sem, no entanto, viabilizar um projeto de psicologia em que fosse possível a interação destas duas possibilidades.

Daí decorrem os estudos de duas psicologias:
a) - Por um lado, a psicologia fisiológica experimental, (que reconhece a existência de uma causalidade psíquica, mas atém seus estudos às influências e à causalidade física enquanto determinante na experiência imediata);
b) - Por outro lado, a psicologia social ou psicologia dos povos(que estuda os processos criativos exaltando a compreensão sobre a causalidade psíquica).
Freud possivelmente viabilizou a tentativa de Wundt sobre provar a unidade psicofísica, ele, preocupa-se em definir rigidamente desde o nome de sua corrente de pensamento para não incorrer em incoerências ou falhas de interpretações de outrem a respeito da confiabilidade de seu trabalho.
Temos, então, um sujeito que sofre, busca algum alívio de suas dores e que vai encontrar — na Psicanálise — um certo tipo de resposta para isso.
Quando Freud — formado em medicina — começou a trabalhar, ainda não sabia que existiam certos tipos de sofrimento que poderiam ser tratados por meio da Psicanálise porque a mesma não existia, e só foi criada à medida que ele se defrontava com seus pacientes e percebia que, para algumas dores, os métodos usuais de diagnóstico, tratamento e cura não funcionavam.
No final dos anos 1890 chamava a atenção dos médicos a existência de uma série de pessoas que, apesar de apresentarem sintomas no corpo — dores, paralisias, convulsões —, não tinham para os mesmos um funcionamento que seguisse uma lógica anátomo-fisiológica. Ou seja, os sintomas não obedeciam às leis de funcionamento do corpo, o que tornava as pessoas que os apresentavam verdadeiras aberrações, incômodos ao conhecimento já estabelecido.
Freud, dentre outros de sua época, intrigava-se com esses fenômenos denominados então como histeria. Seria simples entendê-los como fingimento, encenação. Mas o sofrimento parecia verdadeiro e o fato de Freud acreditar na veracidade do sofrimento daquelas mulheres levou-o a pensar que, talvez, os sintomas de seus corpos quisessem dizer algo, possuíssem algum significado.
Os movimentos do psiquismo
Ao afirmarmos que o sintoma diz algo, representa algo, já temos uma assunção: há algo que quer ser dito e se faz dizer por alguma outra coisa, por um sintoma.
ele percebeu que o sintoma que as histéricas apresentavam, um sintoma estranho, sem correspondência exata com o corpo anatômico, desaparecia quando as pacientes podiam se lembrar do fato que o provocou juntamente com o afeio que acompanhava tal fato.
"Algo no corpo somado a um afeto, o mesmo afeto que antes esteve ligado a um fato e, por algum motivo, se descolou e foi se ligar ao corpo."
Aí reside um ponto importante para entendermos esse homem da Psicanálise: temos um movimento do tal afeto entre o fato que o originou e o corpo, como se ele pudesse se desgrudar de sua origem e investir em qualquer outro conteúdo psíquico. Portanto, o afeto tem uma mobilidade psíquica. Ele investe numa representação ou noutra, no corpo e por aí vai.
Dizemos que há uma força, denominada afeto, que se movimenta pelas representações, os fatos, as coisas, os nomes, o corpo. O ser humano, então, é movido por alguma força, algo que o movimenta e in-veste psiquicamente. Novamente trazemos a idéia inicial: algo existe e faz o sintoma, algo movimenta.
Sabemos, agora, algo mais sobre esse psiquismo: ele não quer sofrer, faz tudo para evitar sofrimento, até mesmo esquecer o que foi aquele fato tão doloroso que estava associado a um afeto, que por sua vez foi parar num sintoma, como se o sintoma fosse causa de sofrimento e não uma tentativa malsucedida de escapar dele.
A lei do princípio do prazer. Quando algo vai contra essa lei, ele é... esquecido.
Um lugar para cada um desses conteúdos do psiquismo: consciente, pré-consciente e inconsciente. Quando Freud escreve A interpretação dos sonhos (1900), ele busca entender como funciona esse psiquismo cheio de condições, contradições e paradoxos que ele viu na histérica e o faz por meio da análise dos sonhos.
Os sonhos são semelhantes aos sintomas: ambos parecem não ter sentido algum e, no entanto, podem ser decifrados. Para analisar os sonhos, Freud toma como método anotar tudo o que lhe vier à cabeça a partir de cada imagem que o sonho contenha. Muitas coisas lhe vêm à cabeça. Primeiro ponto importante: o sonho traz um conteúdo manifesto, aquele do qual nos lembramos, e um conteúdo latente, aquele que aparece na medida em que deixamos a mente vagar pelas imagens do sonho, em associação com o manifesto. O manifesto remete ao latente, permite que as associações conduzam aos conteúdos que permaneciam ocultos. Assim, ele seria uma ponte para esses conteúdos e, ao mesmo tempo, um disfarce dos mesmos.
Parece haver uma semelhança desse modo de funcionamento do sonho com o sintoma. Dizíamos anteriormente que o sintoma poderia ser remetido a uma causa: o fato que o causou e que se desligou do afeto, o qual foi investir no corpo. A realização de um desejo. O sonho é a realização de um desejo. Um pouco atrás mencionamos a intenção do psiquismo: a busca de satisfação, e isso retoma aqui quando percebemos que todas as formações psíquicas atendem ao propósito de realizar um desejo.
O que é desejo?
Temos que entender o que seja para que possamos seguir em frente. Acompanhemos um exemplo que Freud dá para definir o que seja desejo em A interpretação dos sonhos (1900).
Suponhamos um bebê recém-nascido. Ele sente um incômodo que não sabe o que é, se mexe, chora, grita. O ser humano não quer ter desprazer. Então o bebê sente um incômodo do qual não pode se livrar e algo de fora, talvez a mãe, vem e o conforta. O que estava incomodando era fome e a mãe vem e dá o alimento, que aplaca aquele desconforto, faz com que ele cesse por algum tempo. O bebê guarda na memória essa história, registra o desconforto, o acontecimento que o confortou, a sensação que teve de satisfação, de aplacamento. Da próxima vez que tem fome, já não é alguém que não sabe de nada. Ele tenta recriar, no seu psiquismo, de si e para si, a mesma sensação que teve com sua experiência de satisfação e, para isso, recria a mesma percepção, tenta fazer com que a mesma experiência se repita. A isso chamamos desejo, ao movimento que vai do incômodo até a experiência de satisfação recriada — que é a realização de desejo —, ao impulso de recriar a condição de satisfação. O desejo é algo que vai de uma falta a um preenchimento, do desprazer ao prazer.
O sonho é uma realização de desejo. Ele apresenta o desejo como realizado. No sonho, o desejo já se saciou, de uma forma alucinada. O sonho é uma realização alucinatória de desejo, da mesma forma que as primeiras experiências infantis com a fome, por exemplo, como citado anteriormente. Portanto, ele é o remanescente dessa vida infantil, é o mesmo jeito malsucedido de funcionar do aqui/agora que ressurge ao sonharmos: sem tempo, sem adiamento, sem intermediações...
Transcrição de parte do texto dos autores:
Elisa Zaneratto Rosa
Alessandra Monachesi Ribeiro
Marisa Markunas
UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO - UNINOVE - MEMORIAL - BARRA FUNDA
ALUNO: WAGNER BARROS DE JESUS

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O ABORTO ENTRE ADOLESCENTES

O despenseiro fiel.

A Salvação. Russell N. Champlin