Transcrição do texto: Bases Epistemológicas da Psicologia Sócio-Histórica

Transcrição do texto: Bases Epistemológicas da Psicologia Sócio-Histórica
Professor: Alexandre Luccas - Psicologia II
Aluno: Wagner Barros de Jesus

No presente texto, propomo-nos a explicitar a presença desta concepção dentro de tal vertente, sistematizando de forma organizada os diversos aspectos que se relacionam com a Psicologia Sócio-Histórica, no sentido de fundamentação dos conhecimentos por ela produzidos e, ainda, das propostas de atuação para a Psicologia que se seguem. Deste modo, tentamos relacionar uma série de conhecimentos e contribuições já produzidas, procurando reconstituir a base sobre a qual está estruturada esta vertente teórica.
Num primeiro momento, apontamos alguns aspectos essenciais da teoria marxista, procurando explicitar em que consiste a concepção materialista dialética da realidade. Em seguida, tentamos contextualizar brevemente o momento em que se produzem os primeiros conhecimentos dentro de uma abordagem da Psicologia fundamentada nos pressupostos marxistas.
Cabe, então, trabalhar cuidadosamente com a produção teórica que vem se desenvolvendo dentro da abordagem, a maneira como ela concebe o homem e a construção de seu psiquismo, articulando a relação destas postulações teóricas com a base materialista dialética.

A contribuição marxista: o materialismo histórico e dialético.

A produção de Karl Marx (1818-1883) está intimamente relacionada ao momento histórico em que viveu e desenvolveu seu pensamento.
Num primeiro momento, acentua-se o crescimento da economia, das riquezas, das forças produtivas e, paralelamente, das classes trabalhadoras. Configura-se, então, por volta de 1848, uma situação que clama por mudanças:
Dentro destas condições, estrutura-se uma situação paradoxal:
A racionalização do progresso tecnológico permanece em paralelo à desagregação dos modos de vida, sendo impedido a um grande número de pessoas o uso do atributo da liberdade e da vontade tão fortemente proclamado.
Neste contexto, a obra marxista constitui-se em análises sociais, históricas, econômicas e políticas, que, ao mesmo tempo, correspondem a uma grande contribuição para a produção do conhecimento filosófico, uma vez que seu pensamento foi influenciado não só por sua atuação política, mas também por seu contato com as produções teóricas do momento. Neste sentido, destaca-se o contato de Marx com o sistema filosófico hegeliano, a partir do qual recupera a proposição dialética como perspectiva para a compreensão do real e para a construção do conhecimento. Portanto, dentro da teoria do conhecimento, o grande avanço de Marx consistiu em partir da explicação dialética da realidade, cuja proposta foi colocada por Hegel, aplicando a ela uma concepção materialista, o que implica dizer que a marca de seu pensamento é a perspectiva materialista dialética sob a qual propõe a compreensão da realidade, da sociedade e do homem.
Na produção de seus meios de existência os homens se relacionam com a natureza, de onde se extrai os meios de produção e os objetos de trabalho, e se relacionam ainda com os outros homens, no que chamamos relações sociais de produção. Este conjunto de relações constitui a infra-estrutura, ou seja, a base material da sociedade, que determina a organização concreta dos homens, o que implica dizer que a forma de organização da sociedade está determinada pelo modo como os homens se organizam dentro dela para produzir seus meios de existência.
Há um momento em que as forças produtivas entram em contradição com a forma na qual os homens estão organizados em suas relações, de tal modo que a própria organização das relações dos homens vai se alterando com a nova configuração das forças produtivas — nas palavras de Marx, "cada novo estádio na divisão do trabalho determina igualmente as relações entre os indivíduos no que toca a matéria, aos instrumentos e aos produtos do trabalho" (Marx e Engels, 1980:20). É assim que no interior da própria organização de trabalho gera-se uma contradição e, portanto, ela determina sua própria alteração.

Desenvolve-se um conjunto de idéias que a expressam e servem para a reprodução do sistema. Este conjunto de idéias corresponde à superestrutura da sociedade, isto é, sua instância política e ideológica. ou seja, nas idéias e conhecimentos produzidos em uma sociedade, são determinadas pelas mudanças que se concretizam historicamente nas bases materiais (infra-estrutura), uma vez que com elas surge a exigência de novas idéias explicativas e novas regras. A relação entre infra-estrutura e superestrutura é determinante, mas não imediata; as idéias expressam antagonismos da infra-estrutura e isto gera antagonismos também entre as idéias.
A expressão destes antagonismos na superestrutura é complexa, de maneira que o movimento das idéias e da sua relação com a base material deve ser analisado dialeticamente, pois as idéias e conhecimentos se constroem na infra-estrutura, mas também atuam sobre ela, ocasionando transformações em suas relações. Estas idéias dependem da ação para se concretizarem, mas tal ação deve ser coerente com o pensamento.
Segundo Andery e Sério (1994), para Marx a base da sociedade e a característica fundamental do homem estão centradas no trabalho por meio do qual o ser humano se constrói como homem e constrói a sociedade, transformando-a e fazendo a história.

“...Não é a consciência dos homens que determina que é, o seu ser, mas, ao contrário, é o seu ser social que determina sua consciência (o grifo é nosso)... (Marx, 1982, in Andery e Sério, 1994:409)”.

A vida determina a consciência e as idéias surgem da realidade material, sempre em transformação, de modo que os conceitos dominantes apenas se universalizam por conta dos interesses da classe dominante, já que estão a serviço da manutenção do sistema. Assim, é muito comum que o conjunto de idéias desvincule-se das condições materiais que o produziram, de tal forma a permitir a falsa aparência de que estas idéias dominam a história. Seria assim construída a ideologia, levando os homens à alienação: a atribuição das determinações de sua existência e da organização da sociedade desvincula-se das bases materiais, dirigindo-se as explicações a idéias de caráter abstraio e universal.
A partir destas considerações e do conhecimento de tais pontos da produção marxista, torna-se possível compreender em que consiste a concepção materialista dialética da realidade, o que nos permitirá entender melhor as proposições teóricas e metodológicas da Psicologia Sócio-Histórica. Segundo esta concepção, os fenômenos são constituídos e transformados a partir de múltiplas determinações que lhe são constitutivas, as quais são determinadas e fazem parte de outras relações. Concebe-se ainda a realidade como matéria, havendo a primazia do Ser sobre o Pensar, de modo que cada parte desta realidade, e podemos dizer cada fenômeno, constitui-se em uma formação material, que expressa a totalidade que a contém e a determina, ao mesmo tempo em que é determinada por ela.

Para Marx, o concreto é a síntese de muitas determinações e a totalidade, como síntese, deve conter as determinações do todo reordenadas em uma nova unidade.

As coisas se constituem, pois, de contradições e transformações constantes, as quais não se manifestam diretamente. Desta forma, há uma distinção entre aparência e essência, entre a manifestação das coisas e sua real constituição. A aparência, ou a manifestação imediata do fenômeno, é parte dele, mas, não expressa diretamente sua totalidade. Para conhecê-lo realmente, isto é, à sua essência, é necessário ir além desta aparência, desvendando suas determinações.
A produção do conhecimento deve, pois, partir do real, buscar as leis de transformação do fenômeno e sua relação coma totalidade, reinserindo-o, finalmente, na realidade. Deve-se expor adequadamente o movimento real e, portanto, refletir a lei fundamental de cada fenômeno: a transformação dialética. O conhecimento depende, portanto, da busca das determinações e relações intrínsecas e constitutivas dos fenômenos, sendo necessário, para tanto, buscar a compreensão da totalidade em que ele se insere.
Concluindo, o conhecimento verdadeiro é possível, assim como o é uma verdade absoluta em relação ao real, mas esta verdade é sempre relativa ao momento histórico específico. Isto porque a dialética prioriza o processo de transformação, de contradição em relação ao que permanece, sendo que é sempre possível conhecer as leis que regem os fenômenos, mas este conhecimento depende do momento e do contexto em que se insere: a cada momento se tem uma verdade, uma essência, superada com o tempo. Portanto, a verdade corresponde à essência do fenômeno naquele momento específico e deve abarcar, por isso mesmo, seu movimento contraditório.
Os primórdios da psicologia sócio-histórica
A Psicologia Sócio-Histórica surge no início do século XX, na União Soviética, momento em que esta procurava reconstruir suas teorias científicas a partir do referencial marxista. Dentro desta produção, destaca-se o nome de Vygotsky (1896-1934), a quem se deve os primeiros passos em direção a esta nova Psicologia, o qual teve como principais seguidores Luria (1902-1977) e Leontiev (1903-1979).

Mostra-se insatisfeito com as correntes psicológicas soviéticas, apontando a existência de uma crise mundial da Psicologia, uma vez que suas diversas escolas se dirigiam ora para modelos elementaristas, negando a consciência, ora para modelos subjetivistas, considerando a consciência e os processos interiores desvinculados das condições materiais que os constituíam. Parece que os conhecimentos produzidos dentro da Psicologia, na tentativa de compreender quem é o homem e como se constrói sua subjetividade, mantinham sempre a dualidade objetividade versus subjetividade, mundo interno versus mundo externo, oposição que a teoria histórico-cultural de Vygotsky, com as produções que lhe deram continuidade, parece ter conseguido diluir, como veremos no decorrer deste texto.

Sua obra seria, pois, fortemente marcada pela concepção marxista de homem e realidade, uma vez que estava guiada pelo princípio de que o ser humano constrói a si mesmo nas relações que estabelece com a realidade, na medida em que é determinado por esta, atua sobre ela e a transforma.
Vygotsky seguiu alguns pressupostos que guiaram suas teorias e que serviram à fundamentação e ao desenvolvimento, a partir de sua obra, da teoria Sócio-Histórica. Dentre eles, destaca-se a crítica da tentativa de compreensão de funções superiores por intermédio da psicologia animal, bem como da concepção de desenvolvimento natural humano, segundo a qual estas funções são resultado de um processo de maturação. Enfatiza-se a origem social da linguagem e do pensamento — colocando a cultura como parte do desenvolvimento — e a visão das funções psicológicas como produto da atividade cerebral.

Estrutura teórica marxista para a Psicologia: os fenômenos são compreendidos como processos em movimento e mudança; o homem é entendido como um ser que atua sobre a realidade por intermédio, de instrumentos, transformando-a e a si próprio; o conhecimento deve apreender, a partir do aparente, as determinações constitutivas do objeto; a origem e a base do movimento individual estão nas condições sociais de vida historicamente formadas.
“O humano se constitui pela relação do homem com a realidade, não só enquanto meio social imediato, mas enquanto processo cultural historicamente produzido. A condição humana é construída sócio-historicamente, nas relações sociais e na ação dos homens sobre a realidade.”

A crise da psicologia social, a proposta de construção de uma psicologia social crítica e a concretização da psicologia sócio-histórica

Durante muito tempo a Psicologia Social esteve marcada por um caráter e uma tradição pragmáticos, com seus trabalhos centrados no estudo das atitudes, sua mensuração e suas transformações, bem como de aspectos e processos ligados ao funcionamento grupal. Segundo Lane (1984), a partir de meados da década de 1960 a eficácia desta Psicologia começa a ser questionada, apontando-se para uma crise do conhecimento psicossocial, ineficiente em intervir, explicar e prever comportamentos sociais. Para Rodrigues (1981:20), este conjunto de questionamentos, que ele define como a crise de relevância na Psicologia Social, teve início "através de um clamor para maior relevância social das atividades desenvolvidas pelos psicólogos sociais", chegando a atingir, posteriormente, os paradigmas vigentes.

Num primeiro momento aponta para uma produção que denomina como Psicologia Social Psicológica, na qual há uma concepção fortemente guiada pêlos processos psicológicos individuais, compreendendo-se o social como construído a partir da somatória destes indivíduos. Nesta perspectiva, todas as definições acabavam se referindo às suas condutas particulares. Posteriormente, vai se construindo uma Psicologia Social Sociológica, que estava direcionada à questão da interação social, dos processos situacionais e da relação da estrutura social com os indivíduos. Contudo, esta visão possuía um caráter ainda mecanicista, na medida em que mantinha a dicotomia indivíduo versus sociedade: estuda-se e defende-se muito a influência do social no indivíduo, mas este indivíduo não é trazido para o social, perdendo-se de vista o referencial do sujeito, sua particularidade.
É neste movimento que, sobretudo na América Latina e no Brasil, procura-se consolidar a proposta de uma Psicologia Social com bases materialistas-históricas e voltada para a realização de trabalhos comunitários. No Brasil, a Profa. Dra. Silvia Lane se coloca à frente deste movimento, trazendo as produções guiadas pelos pressupostos marxistas, mais especificamente as formulações da Psicologia Soviética, às quais já nos referimos, para a Psicologia Social. A contribuição fornecida pêlos trabalhos desenvolvidos dentro da PUC/SP parecem ser essenciais para a consolidação da vertente teórica denominada Psicologia Sócio-Histórica.
Concretizava-se, deste modo, uma revisão crítica das escolas psicológicas, que caminhava para a construção de uma Psicologia Critica. Todas as reflexões, reformulações e propostas levantadas dentro da área estavam permeadas pela questão da relevância da Psicologia Social, relevância esta que parecia se apresentar cada vez mais vinculada ao contexto e à problemática social. Tentava-se "resgatar, através dos desdobramentos do pensamento marxista, o vigor conceitual e os compromissos filosóficos e políticos (...) necessários a tal redefinição da psicologia e da questão da subjetividade" (Monteiro, 1995:23). Portanto, neste período, a revisão e a reformulação conceitual crítica apoiaram-se em fundamentos marxistas e em teorias neomarxistas, que partiam de sua proposição inicial para a realização de uma reflexão na qual o indivíduo tinha um papel fundamental. Deste modo, a forma como foi e estão sendo estruturadas as propostas teóricas, metodológicas e de intervenção dentro desta abordagem aponta para um comprometimento constante de caráter ético e político com a realidade e o homem. Resta-nos, portanto, partir para a apresentação e sistematização dos pontos essenciais desta produção.
Psicologia sócio-histórica: proposições teóricas
A Psicologia Sócio-Histórica está fundamentada, basicamente, na concepção de homem como um ser histórico-social. Assim, o ser humano não nasce formado ou possuindo uma essência pronta e imutável; ao contrário, ele se constrói como homem a partir das relações que estabelece com o meio e com os outros homens, num movimento dialético em que faz parte de uma totalidade e vai transformando-se em sua essência por um processo de complexificação e multideterminação.

Não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência (Marx & Engels 1980)

Deste modo, o homem é essencialmente um ser social. Há uma relação de mediação entre ele e a sociedade: o homem contém o social, mas não se dilui nele, e vice-versa; ou seja, homem e sociedade não existem separadamente, um sem o outro, mas são, contudo, diferentes. O homem se constrói socialmente, a partir de suas relações com a realidade. Neste movimento ele se apropria de forma subjetiva e particular do social, transforma-o ao interiorizá-lo e, assim, se transforma e se singulariza.
Neste processo de subjetivação, o mundo objetivo é convertido para o subjetivo, produzindo-se um plano interno pela incorporação do externo, processo em que se configura algo novo. Ao mesmo tempo, o homem constrói a realidade através de sua atuação sobre ela e, assim, da objetivação de seu mundo singular, ou seja, de sua subjetividade.
Assim, o homem é essencialmente um ser histórico-social:
Se faz indivíduo humano apropriando-se da produção histórica da humanidade nas relações com os outros homens, a partir do que pode transformar esta história, pois por meio desta apropriação de sua produção cultural pode agir sobre a realidade transformando-a, construindo-a e construindo, assim, a história.

A linguagem é um instrumento essencial neste processo. Ela é produzida social e historicamente e o homem deve também dela apropriar-se. É importante ressaltar que o desenvolvimento da linguagem e dos significados permite a representação da realidade e, assim, a possibilidade de se trabalhar com a atividade no campo da consciência. Contudo, não se pode perder de vista que a origem da consciência e da linguagem está na atividade concreta dos homens, ainda que estas se descolem aparentemente da atividade material.
Autores: Elisa Zaneratto Rosa/Ana Gabriela Pedrosa Andriani
Uninove - Campus Barra Funda - São Paulo

Comentários

Larissa disse…
esse texto é um plágio!!! cópia de A diversidade da Psicologia! páginas: 266 em diante
Quando alguem mal intensionado, escreve texto de outro e diz claramente que o texto é seu, isto é plágio... Devemos aprender o que é realmente um plágio e uma transcrição: No início do texto ou título, logo vemos a palavra "transcrição do texto"... e no final os nomes de autores do texto... Portanto não fui eu que criei, apenas Transcrevi.

No mínimo estes comentários são críticas construtivas... Adoro!

Calouros que ainda estão vislumbrando por buracos de fechaduras, o que a vida realmente é por tráz das portas, é que confundem os termos "plágios e transcrições"...

Eu perdoo!
Se alguem plagiou foi os autores que mensiono logo abaixo...

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